segunda-feira, 6 de março de 2017

A Volta dos Mortos-Vivos (1985) - Crítica

AVISO DE PERIGO: essa crítica é detalhada e contém SPOILERS, portanto se ainda não conferiu o filme, leia por risco próprio.
________________________________________________

Lá na década de 60, o mestre George A. Romero já havia introduzido o macabro conceito dos filmes de zumbi, com o clássico A Noite dos Mortos-Vivos (1968). A ideia deu tão certo, que hoje em dia os filmes de zumbis já possuem seu gênero próprio, tamanha a quantidade de fitas lançadas nos últimos 50 anos. Os italianos abusaram bastante dessas produções, apresentando clássicos gore de primeira qualidade, principalmente envolvendo diretores como Lucio Fulci e Dario Argento. Entretanto, foi o estadunidense Dan O’Bannon (roteirista da franquia Alien), que deu origem a uma das maiores obras do terror moderno: A Volta dos Mortos-Vivos, no curioso ano de 1985. É uma das projeções mais interessantes para se assistir nas fitas VHS (apesar de ser extremamente rara hoje em dia), tem até uma bizarra contagem regressiva de 1 minuto até o filme começar! Conhece aquele conceito de legiões de zumbis correndo pelas ruas grotescamente? Pois bem, começou aqui. Esqueça tiros na cabeça, isso não vai impedi-los de te devorar. Devido ao aspecto "realista", armas são quase inexistentes, por isso você precisa se defender com o objeto mais próximo!

Para quem gosta do estilo, é uma obra prima. O clima é único, temos boas atuações, rock fodido dos anos 80, punks, putaria no cemitério, muitos zumbis e uma atmosfera misteriosa que contagia. Enquanto no filme de Romero tínhamos zumbis mais lentos e silenciosos, aqui são completamente diferentes: eles correm, berram, tem um pequeno índice de consciência e até pronunciam algumas palavras; sem mencionar a maquiagem extremamente interessante de Michael Spatola (também deixando sua marca em Predador 2 e O Exterminador do Futuro 2), com zumbis detonados, mutilados e em estado de decomposição. Muitas pessoas já devem ter trombado com algum filme da franquia A Volta dos Mortos-Vivos, porém, acredite em mim, esse aqui é o capítulo mais gratificante de seu acompanhar, principalmente se levar a história de forma descontraída e sem propósitos ambiciosos (ouso em falar que o terceiro filme também é muito bom, pelas novidades).

O enredo gira em torno de dois funcionários que trabalham em um depósito de remédios e produtos químicos. Para variar, os palhaços acabam liberando o conteúdo tóxico de um tambor do exercito, provocando uma catástrofe acidental. Paralelamente, um grupo de punks que estavam dando uma noitada no cemitério ao lado é surpreendido quando os mortos começam a sair da terra! Sério, mesmo com produções recentes interessantes (como Guerra Mundial Z e The Walking Dead), ainda sinto falta deste tipo de produção caricata, pois eram simples e macabras, sempre surpreendendo os mais desavisados.

Acredite, não é um filme de zumbi qualquer!

Tudo começa dia 3 de julho de 1984, as 17h30 da tarde no horário de verão. Logo vemos o nostálgico depósito de remédios UNEEDA, comandado pelo patrão Burt (Clu Gulager, que também fez A Hora do Pesadelo 2 no mesmo ano), e seus dois empregados paspalhões: o entusiasmado Frank (veterano James Karen, de Poltergeist) e o novato Freddy (Thom Matthews, que no ano seguinte viria a ficar imortalizado pelo seu papel de Tommy Jarvis em Sexta-Feira 13 Parte VI). Naquela tarde, Burk vai embora mais cedo, deixa seus dois funcionários sozinhos no depósito, e não demora muito para tudo sair do controle. É marcante como esse começo transmite mistério e desconfiança; existe uma ausência de trilha sonora durante as conversas no depósito, o que passa a sensação de medo, ainda mais devido aos ecos do local.

Armas? Não! Explosivos? Não! Taco de baseball? SIM!

Freddy está no seu primeiro dia de trabalho, por isso Frank resolve ensiná-lo algumas dicas para se sair bem, e apresentá-lo o local com calma (se aproveitando da hesitação do garoto para assustá-lo). Sem contar que eles guardam corpos frescos para a faculdade de medicina (naquele dia só tinham um na geladeira), o porão do local contém inúmeros tambores com descrições do exércitos, cada um com um corpo dentro. Frank, todo contente em assustar seu aspirante novo, explica que todos esses cadáveres vieram do filme A Noite dos Mortos Vivos (!!!), e que a história realmente aconteceu, porém no filme alteraram os fatos verdadeiros. É interessante ver que os produtores levaram em conta o filme de Romero, basicamente dando uma referência gratuita para os fãs. Enfim, ele conta que o exercito errou o endereço na hora do envio dos corpos contaminados, e eles foram parar ali no depósito.

Ao ir mostrar os tambores para Freddy, o retardado mete um soco no bagulho (afirmando que são inquebráveis) e adivinhem?!... Isso mesmo, o vidro trinca e o gás tóxico 245-Trioxin é liberado diretamente no rosto dos dois, provocando o desmaio imediato. Ao vermos o interior do tambor com o corpo em decomposição efervescida, a trilha sonora chega para brindar o momento, entregando uma das melhores aberturas do gênero (clique aqui para ouvir). Em breve estarei publicando um artigo completo sobre as prioridades desse gás tóxico, analisando seu envolvimento sutil nos filmes da franquia.

O depósito de medicamentos UNEEDA.

Logo conhecemos o grupo de punks que vão alegrar o body count, aqueles bem caricatos dos anos 80, que não ligam para nada, somente gostam de zoar! Todos liderados pelo punk doidão Suicide e seus amigos bizarros, como o tarado Chuck, o drogado Scuz e o negão pacato Spider (interpretado por Miguel Núñez, fazendo um papel quase idêntico em Sexta-Feira 13 Parte V). Não podemos se esquecer das garotas assanhadinhas da vez, como a fofinha Tina, a estilosa Casey e a punk chapada de cabelo vermelho Trash (Linnea Quigley, a scream queen que sempre aparece pelada em seus filmes)! Todos estão esperando Freddy sair do trabalho no depósito, pois Tina é sua namorada. Enquanto esperam, o bando de inúteis resolvem invadir um cemitério abandonado que fica ao lado do depósito! Destaque para o carro conversível pichado que a gangue tem. É clássico.

O grupo de punks dos anos 80.

Quando acordam no depósito, Frank e Freddy estão passando mal (após ingerirem o gás tóxico) e o corpo que estava dentro do tambor desapareceu. Como a substancia percorreu o prédio, tudo que já possuiu vida algum dia começa a voltar lentamente, como as borboletas que serviam para estudo, ou os cachorros cortados ao meio que eram usados por veterinários. O desespero só aumenta quando aquele cadáver da geladeira (pelado e careca) acorda como se fosse um doente mental descontrolado. Esse é o primeiro zumbi que vemos com vida na franquia, e provavelmente um dos mais lembrados.

Após chamarem o patrão Burt de volta, o trio desesperado tenta impedir o zumbi de uma forma brutal: cravando uma picareta em seu crânio (!!!), posteriormente serrando sua cabeça e membros com um serrote cego! Do mesmo jeito, ele ainda continua se mexendo, e o grupo resolve ensacá-lo rapidamente e levar os pedaços vivos até o necrotério vizinho, para cremá-los (afirmando serem doninhas)!

Frank, Freddy e Burt serrando o zumbi!

É nessa fase que o filme já mostra seu objetivo: é uma violência grotesca e explicita, mas o clima descontraído e misterioso faz tudo parecer uma comédia sádica! As atuações são dramáticas, com berros agonizantes, caras e bocas de todos os envolvidos. Burt é o resmungão inteligente, Frank é o desesperado impaciente e Freddy (pobre Freddy) acaba se vendo completamente aterrorizado nessa situação alucinada. A maquiagem é outro ponto forte que não foi economizado em momento algum; vemos e sentimos todos os golpes, machadadas, picaretadas, disparos de revólver... É tudo muito efetivo.

Ao chegarem com o corpo no necrotério claustrofóbico, conhecemos o legista solitário Ernie (Don Calfa), ótimo personagem, que os ajuda por dever um antigo favor para Burt. Eles queimam o corpo do zumbi no grande forno, em potencia alta, para não sobrar nenhum músculo. Quando tudo parecia estar resolvido de uma vez por todas, a fumaça tóxica cuspida pelo forno do necrotério acaba chegando no cemitério ao lado, saindo da chaminé e provocando uma chuva ácida, trazendo todos os mortos de volta a vida. É curioso ver como a marcante trilha sonora aparece somente nos momentos em que algo errado acontece, assim como em Halloween (1978).

Brains! Braaaaains!

O grupo de punks permanecia tranquilo no cemitério quando o evento acontece, bebendo altas doses e até mesmo organizando o clássico show de strip-tease em cima dos túmulos, protagonizado pela punk Trash (por sinal, sempre que alguém menciona algo relacionado à morte perto dela, a garota se excita e fica peladona)! Os zumbis saem da terra ao som de Party Time (45 Grave), provavelmente a música mais lembrada do filme! Desesperados, o grupo acaba fugindo e se separando; Trash fica para trás e é morta brutalmente. Alguém tempo depois, vamos vê-la voltando como zumbi, pelada, com a pele branca e uma boca enorme! Já o resto do grupo se refugia no depósito e no necrotério, se encontrando com Burt e os outros sobreviventes. Ainda rola a famosa cena em que Tina vai procurar o namorado Freddy no depósito, e acaba trombando o zumbi que estava armazenado no tambor do começo do filme (conhecido como “Tarman”), totalmente molenga e decomposto! Me lembro das vezes que assisti A Volta dos Mortos-Vivos quando criança, e esse momentos era um dos mais marcantes! Nessa cena é usada perspectiva distorcida (aquelas que forçam os pontos de fuga), parecido com o visto em Um Corpo que Cai (1958)! Foda é pouco!

Gradativamente, por terem respirado o gás tóxico, Frank e Freddy vão ficando doentes e inválidos, até que finalmente chamam uma ambulância de paramédicos para diagnosticar o caso. Quando os médicos chegam, eles percebem que os dois estão sem pulso há muito tempo, sem conseguirem explicar o motivo. Em pânico, Frank e Freddy acabam entrando lentamente no rigor mortis, provocando uma dor insuportável. O rigor mortis é um processo que o corpo passa após um período sem vida, nessa fase, os músculos ficam duros e rígidos iguais pedras, e precisam ser alongados para manter a flexibilidade. Estão virando mortos-vivos aos poucos. É agonizante.

A transformação sempre é dolorida.

Os zumbis atacam sem piedade, inclusive matando os dois paramédicos (quando eles saem na chuva em direção da ambulância) e até pedem reforços pelo rádio do automóvel, solicitando que enviem mais paramédicos! É claro, tudo isso de uma forma medonha e característica. Eles armam emboscadas para a policia também, conseguindo arrastar vários agentes para a morte. Temos até um zumbi anão em uma das cenas (ou pode ser uma criança), correndo pelo gramado com as pernas arrebentadas! Em uma das cenas mais tensas, Ernie consegue capturar e amarrar um zumbi feminino (cortado ao meio), e tenta arrancar informações. O cadáver detonado revela que estar morto é extremamente doloroso, eles não tem opção, por isso se alimentam com cérebros humanos... Os cérebros fazem a dor passar.

Freddy acaba virando zumbi em uma ótima cena, na capela interna do necrotério, nos braços da namorada Tina. Thom Mathews dá conta do papel com folga, agindo de forma violenta e sádica! Inclusive, Ernie joga ácido sulfúrico em seu rosto, o irritando profundamente. Por outro lado, ao descobrir que está virando um zumbi, Frank acaba se suicidando em uma sequência dramática, entrando no forno do crematório e deixando sua aliança para fora. Bem tenso.

Linnea Quigley fica pelada até como zumbi!

Se aliando com Spider, o patrão Burt consegue voltar para o seu depósito para, sem alternativas, discar o número do exército que estava nos tanques contaminados. Para sua surpresa, o coronel Glover (Jonathan Terry, de Halloween 3), já estava esperando muito tempo por essa ligação, desde que havia perdido a localização dos tambores. Ele já sabia se alguém ligasse naquele número após tantos anos, era porque a epidemia já havia saído de controle. O exército tinha um plano preparado para essa ocasião, no caso, detonar um enorme míssil na área contaminada pelo gás tóxico, e destruir todas as evidencias possíveis sem deixar nenhum rastro! Isso mesmo, uma total queima de informações por base do governo!

E de um jeito ou de outro, o plano inesperado é executado já no finalzinho do filme. Acompanhamos um míssil teleguiado dourado sendo detonado na região, já na manhã seguinte (dia 04 de julho as 05h01 da matina), basicamente matando todos que estavam por lá, incluindo os sobreviventes esforçados. Essa ideia até lembra o desfecho de A Noite dos Mortos Vivos, só que muito mais generalizado. Existe também um final alternativo (encontrado em qualidade desgastada), mostrando algumas cenas extras que deixam mais visível toda essa ocultação de informações por base do exercito norte-americano... Mas em sua opinião, como deveriam ter acabado com esse problema?

A solução final não foi muito feliz.

Esse míssil provoca outra chuva ácida, e a narração final afirma que, apesar de todas as tragédias e mortes, a “chuva vai sumir com tudo”... Será mesmo? Será que não existem outros tambores do exército perdidos por ai? Fica a dúvida. Por enquanto, essa projeção continua sendo um dos melhores filmes de zumbis já feitos, com muito humor negro e corpos amontoados! A Volta dos Mortos-Vivos (1985) não é para se assustar, e sim para se divertir tomando algumas cervejas com os amigos, abrindo sua consciência para muita conversa descontraída e relaxada. A franquia sangrenta voltou somente 3 anos depois, em 1988, já abordando um enredo diferente, porém mantendo tudo que “aprendemos” por aqui. A honra da vez fica com Romero, que mesmo não tendo nenhum envolvimento por aqui, acabou sendo o verdadeiro influenciador. Vale a pena conferir, com certeza!
____________________________________

TRAILER DE 1985:
____________________________________


____________________________________

CURIOSIDADES:
1) O filme começa anunciando se tratar de fatos reais, com a frase de letreiro "Os eventos mostrados neste filme são reais. Os nomes das pessoas e organizações são verdadeiros".

2) Tobe Hooper foi a primeira opção para dirigir o filme. Até pensaram em chamá-lo para dirigir os possíveis quarto e quinto filmes, mas nada foi confirmado, segundo rumores.

3) O primeiro roteiro foi escrito por John Russo (roteirista de A Noite dos Mortos-Vivos, clássico de Romero), justamente em 1978, quando Romero produzia Despertar dos Mortos. O roteiro foi comprado por um produtor independente, Tom Fox, que acabou chamando Dan O'Bannon para dirigi-lo. A principio, O'Bannon não gostou do projeto ser uma "sequência" de A Noite dos Mortos-Vivos, por isso resolveu reescrever o roteiro com muito humor-negro. Mesmo assim, o clássico de Romero ainda é mencionado em algumas cenas.

4) Dan O'Bannon escreveu o personagem de Frank para ele mesmo interpretar. No entanto, quando James Karen foi fazer um teste para outro papel, ele percebeu que aquele seria o Frank ideal.

5) Do mesmo jeito, O'Bannon ainda tem uma participação no filme, fazendo a voz do piloto do helicóptero da polícia.

6) Originalmente, assim como outros projetos, seria exibido em 3D!

7) A atriz Jewel Shepard já estava escalada para interpretar Trash, mas desistiu após descobrir que teria de passar quase o filme inteiro pelada. Por sorte, o papel acabou ficando com a scream queen Linnea Quigley, que ficou conhecida como a musa dos filmes de terror. Jewel ainda aparece no papel de Casey.


8) Reza a lenda, que o próprio George A. Romero teria se interessado muito ao ler o roteiro, se oferecendo para produzir. Entretanto O'Bannon não queria que pensassem se tratar de uma continuação da obra de 68, então resolver dispensar o mestre dos zumbis!


9) James Karen e Thom Mathews (interpretes de Frank e Freddy) também retornam para o segundo filme, mas como personagens completamente diferentes (dois ladrões de túmulos). Nos dois filmes, eles protagonizam a mesma frase marcante: Karen resmunga "garoto, se você gosta deste trabalho..." e Mathews se interpola desesperado "gostar deste trabalho?! Gostar deste trabalho?!".


10) Brian Peck (que interpreta o punk Scuz) também volta no próximo filme, só que atuando como 5 zumbis diferentes!

11) Custou 4 milhões para ser produzido e rendeu 12 milhões somente nos cinemas norte-americanos.

CONTAGEM DE CORPOS (número não exato):
Assassinos zumbis:
Suicide: cabeça rasgada com dentada certeira.
Trash: devorada viva por um grupo de zumbis.
Jerry: cérebro devorado.
Quatro paramédicos: atacados pelos zumbis em uma emboscada.
Scuz: mordido na cabeça.
Mendigo Hobo: cérebro devorado pela zumbi Trash.
Dez policiais: atacados por um grupo de zumbis.
Grupo extra de policiais: também atacados pelos zumbis.
OUTRAS MORTES:
Freddy: transformado em zumbi após ingerir 245-Trioxin.
Frank: também transformado em zumbi após ingerir o gás, porém acaba se suicidando ao entrar no forno do crematório.
Tina: atacada por Freddy, morta com explosão do míssil.
Ernie: morto na explosão do míssil.
Todos os zumbis: mortos na explosão do míssil.

Comentários
0 Comentários

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Compartilhe sua experiência conosco! Gostou do filme? Teve bons momentos quando assistiu? Mas lembre-se, seja educado e não cause intrigas nos comentários, do contrário, a maldição do Portal Tartárico te atormentará para sempre!

POR FAVOR, NOS INFORME CASO O FILME ESTEJA QUEBRADO (INDISPONÍVEL). O ARQUIVO SERÁ CORRIGIDO O MAIS RÁPIDO POSSÍVEL.