AVISO
DE PERIGO: essa
crítica é detalhada e contém SPOILERS, portanto se ainda não conferiu o filme, leia por
risco próprio.
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No final da gloriosa década de 70, Halloween - A Noite do Terror (1978) estava estourando nas bilheterias mundiais, como
nenhum filme do gênero jamais havia feito; John Carpenter basicamente inovou o
conceito dos “slasher movies” com seu terror simples e bem orquestrado.
Obviamente, não ia demorar muito para fazerem uma continuação do sucesso, no
entanto, Halloween II – O Pesadelo Continua (1981) foi lançado somente três anos depois, mas
mantendo exatamente o mesmo clima que o antecessor usou para conquistar uma
legião de fanáticos até os dias atuais. É muito bom.
Mesmo o primeiro filme sendo um
clássico incomparável, uma coisa todos devem admitir: Halloween II é muito mais
creepy e assustador que o anterior, exibindo em seus 92 minutos de projeção uma
trama sombria e solitária, recheada com cenas marcantes e sequências mais
aprimoradas. Aqui temos uma grande evolução na produção, tendo em vista que os
produtores já estavam com o dinheiro necessário para esbanjarem uma história
satisfatória aos que ficaram três longos anos na expectativa; gratificante,
porque o filme é tão bom quanto o anterior.
Desta vez, John Carpenter prefere não
sentar na cadeira do diretor, e passa o bastão para Rick Rosenthal (que viria a
dirigir Halloween Ressurreição em 2002), mas o nosso querido Carpenter continua
na produção e assina o roteiro ao lado de Debra Hill. O charme desse filme é
que se passa completamente durante a noite, exatamente da onde o primeiro
terminou, e conseguimos acompanhar a continuação daquela perturbadora noite de
Halloween; outro fato marcante é que esse abordou maior violência e mortes mais
fortes, se igualando ao padrão que já dominava a época e se distanciar de seu
antecessor, que só contava com cinco mortes em tonalidades realistas.
A fita começa com a nostálgica
entrada da Tec Home Video, e logo ouvimos a canção Mr. Sandman na abertura,
nessas circunstancias, a canção animada se torna fria e assustadora, porque
sabemos que Myers estará em tela logo menos. Então vemos o final do filme
anterior, com o psiquiatra Samuel Loomis (Donald Pleasence eternizando o
papel), encontrando seu paciente foragido Michael Myers, e descarregando o
revólver em seu peito; aqui rola uma intrigante mudança entre os dois filmes:
enquanto no primeiro Myers desaba da sacada TRASEIRA da residência dos Doyle após
receber os tiros, nesse o assassino cai da sacada FRONTAL da casa, se
esborrachando no escuro jardim de entrada. A mudança é estranha, mas não agrega
em nada. Como todos já devem se lembrar do último desfecho, Loomis não encontra
o corpo do paciente ao ir verificar, somente marcas de sangue pelo gramado.
Lommis parado diante da residência dos Doyle.
Vemos que os disparos do revólver
acordaram o vizinho, e ele sai na vizinhança indagando para Loomis que porra
acabou de acontecer. Nosso eterno psiquiatra responde com a lendária frase: “you
don’t know what death is” ou “você não sabe o que é a morte”, e a trilha sonora
começa a trovejar, enquanto vemos Loomis saindo correndo pela vizinhança, no
intuito de encontrar Myers o mais breve possível; a trilha sonora também tem
uma diferença, ela é mais alta e “menos comportada”, dando uma sutil diferença
que não incomoda, parece um remix oitentista de qualidade. Novamente temos uma
abóbora de abertura, crescendo em nossa direção enquanto os créditos aparecem
em fonte laranja, mas dessa vez, a “câmera” não entra no olho da abóbora
talhada, porque ela se racha no meio e dentro vemos uma caveira mal
desenvolvida. Acho que isso é uma dica que Myers não é mais um “mortal” como o
último filme deixou no ar, ele não passa de um aspecto do Halloween, cravado em
uma abóbora na forma de caveira.
A última abertura nesse estilo.
Em seguida acompanhamos o nosso
assassino vagando pela vizinhança, afetado pelos tiros que acabou de receber.
Como no antecessor, as câmeras em “primeira pessoa” marcam toda a lentidão
poética de Myers. Pelos jardins das residências, ele encontra um cachorro (mas
dessa vez não mata rsrs), crianças pedindo doces e até mesmo Loomis encontrando
o xerife Leigh Brackett (Charles Cyphers reprisando seu papel) e avisando que
acertou seu paciente com o revólver e o mesmo saiu andando como se nada tivesse
acontecido. Michael acaba chegando à pequena residência de um casal de velhos,
com o objetivo de roubar uma faca; lembram que ele havia deixado a que usava na
residência do Doyle? Pois bem, a velhinha faz um sanduíche para seu marido, que
dormiu no sofá assistindo A Noite dos Mortos-Vivos (1968) em uma rápida
homenagem ao clássico de George A. Romero, Myers entra sorrateiro na cozinha e
pega a enorme faca que ela cortava o presunto. O clima “de fim de noite” é
muito forte aqui, proporcionando uma solidão que marca cada segundo corrido do
filme; só assistindo para conhecer essa nostálgica sensação.
No momento que Michael entra na
pequena casa, a televisão começa a exibir o noticiário de última hora, avisando
sobre o paciente foragido que acaba de fazer três vitimas em Haddonfield, e
dando a oportunidade para nosso assassino roubar a faca com a distração da
velhinha. Ao voltar na cozinha, assustada por descobrir sobre a tragédia na rua
ao lado, ela berra ao encontrar somente sangue na bandeja com presunto.
Observando a velhinha em "primeira pessoa" pela janela.
Agora armado com sua faca, Myers vai
até a residência vizinha da família Martin, somente a filha do casal esta na
residência, Alice, que conversa com sua amiga Sally no telefone (Sally ligou
para Alice com a intenção de avisá-la sobre os assassinatos que estavam informando
na rádio, apenas um quarteirão da casa dos Martin). Pelo visto, após Loomis se
encontrar com o xerife Brackett, as mídias da cidade já começaram a trabalhar
no caso imediatamente; mesmo com o feriado de Halloween, as ruas da pequena
cidade enchem de repórteres, policiais e curiosos.
Alice fica assustada após receber a
notícia da amiga e ouvir as sirenes na rua ao lado, não percebendo que estava
sendo observada por Myers. Quando entra na residência, rola a clássica cena
do “pulo” do assassino, escondido atrás de um vaso e saltando para enfiar a
faca no pescoço da garota. A fotografia do filme pega a morte “debaixo” do
pescoço da atriz, focando também os olhos arregalados de Myers, e vemos o
sangue jorrar em seu queixo no que sabemos ser uma cena memorável. Existe
fóruns na internet discutindo a razão de ele ter assassinado Alice, a mais
provável seja que nosso assassino precisava de algum lugar para se esconder,
levando em conta que ainda estava no quarteirão ao lado da onde foi baleado, e
agora o local se encontrava repleto de policiais. Acreditem em mim leitores,
esses pequenos detalhes dão uma profundidade imensa no “universo” criado para a
franquia, instigando nossa busca eterna por informações interessantes.
Alice, a vitima inocente.
Então finalmente vemos Laurie Strode
(mais uma vez interpretada pela incrível Jamie Lee Curtis <3), sendo resgatado na
residência dos Doyle pelos policiais e paramédicos. Logo percebemos que Tommy
Doyle e Lindsey Wallace, as crianças que Laurie e Annie Brackett cuidavam
naquela noite, não aparecem mais no roteiro e em nenhum momento do filme
(somente no flashback inicial). O filme agora vai se dividir em dois ambientes:
o Hospital Memorial de Haddonfield, para onde Laurie é levada de ambulância, e
as ruas escuras da cidade, onde Loomis e o xerife Brackett começam uma busca
por Myers.
Enquanto rondam a região na viatura,
Loomis vê alguém descendo a rua com uma máscara branca semelhante, e logo sai do carro
para persegui-la (o psiquiatra e Laurie foram os únicos que viram Myers
trajando o acessório). O rapaz é Ben Tramer (a paixonite de Laurie, mencionado
no primeiro filme) que vem voltando bêbado de uma festa, usando uma máscara
idêntica a de Myers, só mudando que é loura. Não demora muito para um policial “perder o controle” e “enfiar” a viatura no civil, explodindo uma van e
carbonizando o jovem rapaz (!!!). Loomis acaba percebendo que aquele não era
Michael, e mataram um inocente (noite agitada em Haddonfield rsrs).
Ben tramer, a pessoa mais azarada do planeta (first).
Acontece que o xerife Brackett sempre
se manteve cético em relação a Myers, achando que Loomis estava exagerando com
a situação, até o momento que recebe a noticia da morte de sua filha Annie,
encontrada em um quarto da residência dos Wallace, junto dos corpos de Bob e
Lynda. Brackett muda de atitude radicalmente, chegando a acusar Loomis pela
fuga de Myers; também conhecemos o policial Hunt (Hunter von Leer), pouco explorado no roteiro,
mas marcado por ser um dos únicos personagens que acredita em Loomis. Como no
anterior, nosso psiquiatra lança várias frases de efeito a respeito de Myers,
sendo o único que realmente conhece a personificação do mal que ocorre com seu
paciente de 21 anos.
Aproveitando a ocasião do Halloween,
Myers anda tranquilamente pela rua, sem que sua máscara chame a atenção (além
disso, somente Loomis e Laurie sabiam que ele estava mascarado), até chegar ao
Hospital Memorial para continuar sua caçada sangrenta; nesse filme ele não
utiliza mais o carro roubado de Smith’s Grove, porque obviamente chamaria
atenção. Nessa etapa, somos apresentados aos funcionários do Hospital (quase
vazio com o Halloween), que vamos acompanhar pelo resto do filme: as
enfermeiras Sra. Alves (uma mulher mandona e autoritária), e Karen, a bonitona
peituda da vez; também conhecemos Janet e Jill, outras duras assistentes do
pacato Dr. Mixter. Ainda temos o paramédico Jimmy, que tem uma leve paixonite
por Laurie, e o brincalhão Budd, folgado e com seu memorável olhar atrevido.
O Hospital da um tom sombrio e
solitário na película, realmente se tornando assustador somente com seus longos
corredores silenciosos e com tonalidades amarelas fortes. O local não
transparece nenhuma harmonia ou descontração, palco perfeito para o espetáculo
que Myers vai protagonizar. Nosso assassino também esta muito mais frio e
“durão” em suas atitudes, sempre andando extremamente lento e com poucos
movimentos no pescoço.
Rapaz nervoso... Literalmente com o "peito estourado".
Quando Laurie é informada que Michael
Myers era o homem que a perseguia, e altamente dopada pelos remédios,
presenciamos um flashback em forma de sonho (bem rápido mesmo), que nos deixa
uma pequena dica sobre sua “relação” com o assassino. Vemos a mãe de Laurie
afirmando que ela não é sua mãe biológica, e vemos Myers criança olhando pela
janela do hospício Smith’s Grove; tudo isso enquanto uma poça de sangue se
forma no fundo preto.
Aos poucos Myers vai eliminando cada
funcionário do Hospital, utilizando um bisturi na maior parte do tempo; ainda
utiliza seringas e um martelo. Rola até mesmo uma cena de Karen e Budd transando na
hidromassagem da fisioterapia, porque claro, isso não pode falta nos filmes do
gênero, mas logo nosso assassino cuida deles da melhor forma (rsrs). Outro
fator é que a antiga residência dos Myers esta sendo linchado pelos moradores,
em forma de protesto, e o policial Hunt é chamado para apaziguar a cena, sempre
com Loomis na cola. Interessante como nesse filme a presença da polícia é muito
mais forte: enquanto no antecessor conhecemos somente o xerife Brackett, aqui
todas as autoridades estão agindo com a tragédia inesperada.
Os policiais de Haddonfield nunca tiveram tanto trabalho rsrs.
Já nas altas horas da madrugada de
Halloween, após descobrir que Myers invadiu a escola da cidade mais cedo,
Loomis é escoltado de volta a Smith’s Grove por um policial e pela enfermeira
Marion (Nancy Stephens novamente), devido à tamanha repercussão que seu
paciente foragido causou, interferindo nos projetos do hospício; Marion se
demonstra uma bela mulher, sem seus trajes de trabalho mostrados no começo do
filme anterior. Ela conta para o psiquiatra sobre um arquivo secreto que o
governador ocultou a respeito da família Myers, revelando que Laurie Strode é irmã de
Michael, nascida dois anos após ele ter sido confinado. Loomis percebe que o
intuito do paciente é matar a irmã, como fez com Judith Myers em 1963, e ruma
rapidamente para o Hospital após ameaçar o oficial que o escoltava.
No momento que Myers encontra Laurie
(numa cena inesquecível), temos uma de minhas perseguições preferidas, com
nossa querida adolescente dopada pelos remédios, basicamente não dando um só
grito durante o clímax, tamanho o medo que estava presenciando. Michael tem uma
capacidade impressionante para traumatizar qualquer um, sem dizer qualquer
palavra. Sem contar que a “pegada” da trilha sonora em nova versão é excelente,
aumentando o clima.
Curiosidade: Jamie Lee Curtis usava uma peruca nesse filme.
Laurie é “resgatada” quando Loomis
chega ao local, e acompanhamos um dos finais mais fodas da franquia, fora a
clássica cena que comprova a imortalidade de Myers, ao ser baleado novamente
pelo psiquiatra e continuar respirando; nessa altura, até mesmo o determinador
Loomis começa a fugir, já não tendo alternativas para lutar contra o Pure Evil.
Laurie consegue acertar dois tiros nos olhos do assassino (ou acima dos olhos),
dando um dos pontos mais misteriosos da série: como ele consegue continuar
enxergando nos próximos filmes? Claro, nesse capítulo eles estavam pensando em
MATAR o assassino de vez, e não sabiam que voltariam com a franquia em 1988;
pra quem tem interesse, vale a pena procurar sobre o assunto nos fóruns
americanos, onde ele é muito bem explorado com várias teorias criadas que aumentam a
profundidade da obra.
Como acabei de mencionar, esse era
para ser o “último” filme da série, então Loomis toma uma atitude drástica, ao
liberar o conteúdo de alguns tanques de oxigênio e se explodir junto do
desgovernado assassino. É deixado no ar se o psiquiatra morreu ou não, Michael
Myers, por outro lado, aparenta ter sido morto de uma vez por todas, em chamas no
corredor destruído. Laurie continuou viva, e a vemos sendo resgatada ao
amanhecer (única cena do filme que é dia), pelo policial Hunt e outros oficiais.
Logo ouvimos a canção Mr. Sandman novamente, enquanto Michael queima lentamente
no chão, com sua icônica máscara colada no rosto em chamas.
Chorando sangue, mike?
Existe uma versão para televisão do
longa que conta com MUITAS mudanças, conhecida também como “producer’s cut”,
mas não vou falar sobre ela, pois seria necessário uma lista e talvez uma própria
critica, devido ao grande número de diferenças entre as duas belas versões. O filme é
considerado uma obra cult do gênero e respeitado por todos, mesmo abordando o primórdio
do “padrão slasher movies”.
Halloween II - O Pesadelo Continua (1981) é uma mistura de
trama inesquecível, atmosfera única, fotografia e personagens
marcantes; tudo orquestrado em conjunto da ótima trilha sonora assustadora.
Michael Myers prova que é o assassino com mais classe e “estilo” que o gênero já
teve, bebendo da bendita fonte da qualidade em cada segundo que aparece. Como
muitos já devem saber, a franquia voltaria no ano seguinte com Halloween III –
A Noite das Bruxas (1982), que abordava uma história completamente diferente,
aproveitando o grande sucesso que a marca possuía na época. Nosso eterno
assassino de máscara branca voltaria somente em 1988 na conturbada fase da
produtora Moustapha Akkad, no quarto filme da franquia, mas isso é uma bela
conversa para outra critica. Halloween, por algum motivo, nunca mais teve o mesmo significado.
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TRAILER DE 1981:
CONTAGEM DE CORPOS (9):
Assassino Michael Myers:
Alice: facada abaixo do queixo.
Sr. Garett: martelada na cabeça.
Budd: estrangulado com uma corda.
Karen: afogada na banheira com água fervendo.
Dr. Mixter: furado no olho com uma seringa.
Janet: ar injetado no cérebro com seringa.
Sra. Alves: sangue drenado com cateter.
Jill: esfaqueada nas costas por bisturi.
Policial Marshal: garganta cortada por bisturi.
OUTRAS MORTES:
Bennett Tramer: atropelado por uma viatura e carbonizado.