segunda-feira, 21 de novembro de 2016

A Morte Pede Carona (1986) - Crítica

AVISO DE PERIGO: essa crítica é detalhada e contém SPOILERS, portanto se ainda não conferiu o filme, leia por risco próprio.
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Tenho um amigo que é completamente viciado nesse filme, por isso já começo essa crítica com certa dedicação; A Morte Pede Carona (1986) é cruel e mensageiro, deixando uma bela “premonição” para os que se aventuram pelo interior norte-americano, sem saber dos males que perpetuam silenciosamente na história. The Hitcher, como chamado no titulo original, é um road movie de terror que apresenta vários momentos memoráveis do gênero. John Ryder não é tão famoso como Jason Voorhees, ou Freddy Krueger, mas o serial killer é tão bem desenvolvido, que em certo ponto da trama começamos a “gostar” dele (como acontece com os pioneiros, estilo Michael Myers).

Lançado em 1986, o filme carrega uma história realista, a qual pode acontecer com qualquer leitor que está acompanhando essa crítica. Você já deu carona para algum desconhecido?... Pois bem, acredite, depois desse filme, você vai pensar duas vezes antes de executar tal ação. A questão não é dar carona para alguém, e sim, ser perseguido até cumprir um objetivo desconhecido (mais para mental e espiritual), mudando brutalmente a personalidade do protagonista. Sendo provavelmente o trabalho mais famoso do diretor Robert Harmon, é altamente recomendado assistir essa película em VHS, porque a fita carrega uma imagem fosca e sem contraste, enriquecendo o clima de interior americano (os desertos sem lei). O visual lembra muito Quadrilha de Sádicos (1977), O Massacre da Serra-Elétrica 3 (1990) e até mesmo Breakdown – Implacável Perseguição (1997).

C. Thomas Howell interpreta o dramático personagem Jim Halsey, um jovem ingênuo que esta levando um carro até a Califórnia, e como todos devem imaginar, ele dá carona para um psicopata durante o trajeto no interior americano. John Ryder (o eternizado Rutger Hauer) é o misterioso homem que assassina todos que lhe dão carona; Jim consegue escapar, mas é perseguido e sendo acusado por todos os corpos derrubados no caminho, generalizando uma extensa loucura sádica que domina o protagonista. Com aquele drama afiado, vamos começar:

A morte pede carona.

Uma pequena curiosidade: no VHS da Flash Star, a projeção se inicia em um estranho formato widescreen, e sem mais nem menos, volta a ser fullscreen de uma tomada para outra; isso é bizarro e diferenciado, talvez até exclusivo. Começamos numa noite escura e serena, no “deserto” Texano (alá Easy Rider), Jim está atrás do volante com seu despreocupado cabelão de galã e a jaqueta “badboy” de couro. Não demora muito para o assassino ultradimensional fazer sua primeira aparição, pedindo carona debaixo da forte chuva. Jim lhe cede o favor, mesmo com sua inocência apetando o peito; na verdade, o jovem estava caindo de sono atrás do volante, por isso, a carona pode ter sido somente para se manter acordado e não provocar algum acidente. Então conhecemos John Ryder, misterioso, de poucas palavras e olhar penetrante; não demora para o clima tenso começar a se desenvolver com uma sutileza agonizante.

Jim Halsey, o badboy não mais tranquilo.

É final de madrugada, e Jim desconfia do passageiro quando o mesmo não responde suas perguntas básicas. Rutger Hauer é imortal no papel de John Ryder: o cara tem pinta de galã, olhar de assassino e voz de ditador; por algum motivo, ele me lembra do sádico Vilmer Sawyer (Matthew McConaughey) em O Massacre da Serra-Elétrica – O Retorno (1994), só que MUITO mais controlado e determinado, porque como todos sabem, Vilmer somente berrava e se cortava nas transes da perna mecânica, já John Ryder tem uma classe única, convincente e assustadora. Seu papel não é somente de um assassino preocupado em aumentar o body count, mas sim armar uma sucessão de acontecimentos que destruirá a vida do protagonista, ao mesmo tempo em que o ajuda, como se também fosse um aliado.

Não demora nem 15 minutos de projeção e já vemos o jovem Jim desesperado e rendido por uma faca, enquanto é obrigado a dirigir pelo escuro deserto sem fim. Rola também a clássica cena em que alguns trabalhadores e policiais bloquearam a pista para obras, e os dois são abordados na blitz, no entanto, John consegue fazer com que nosso protagonista se mantenha controlado e não tome nenhuma atitude sem pensar. Os jogos mentais não param.

John Ryder, o galã cruel dos desertos.

Thomas Howell também é ótimo como Jim Halsey, representando o típico adolescente americano, bonitão do colegial, despreocupado e sem nenhum problema com os males do mundo. Talvez, o fator mais interessante do filme seja a “evolução” do protagonista (decadência, na verdade), passando de um jovem inocente e simpático para um homem frio e amargurado. O “sequestro” no carro não dura muito tempo, porque em um momento de desespero, Jim consegue jogar o assassino para fora do automóvel, já com o dia amanhecendo no horizonte acinzentado. Gritando de alegria, o garoto parecia estar a salvo, mas tudo estava apenas começando em sua jornada...

A questão é que John Ryder não se limita somente com uma vitima, pois sem contar que já havia deixado um rastro de sangue pela estrada solitária, algumas horas mais tarde, Jim é ultrapassado na rodovia pelo carro de uma família tradicional, com crianças no banco traseiro; John está lá dentro, e acena para nosso protagonista. O jovem faz de tudo para avisar a família que eles vão ser mortos com a carona maldita, mas quase provoca um acidente. A direção de Robert Harmon nunca mostra os corpos da família, mas somente pela reação de Jim (vomitar), já sabemos que o estrago foi feio. Ele começa a perceber que está ajudando o assassino sanguinário em um estranho jogo, enquanto o mesmo usa modos suaves para seduzir suas vitimas. Aqui não temos um roteiro típico de slasher movies, pois no lugar, Eric Red escreve um drama cheio de qualidade e mistério, desenvolvido em um local que o protagonista não pode receber a ajuda de ninguém.

Interior do mal.

São vários os encontros com o assassino, isso transparece uma ideia de “alucinação”; é como se John Ryder sempre estivesse um passo a frente de Jim, já deixando a situação montada para o protagonista resolvê-la. Existem inúmeras cenas memoráveis e clássicas, como a dramática explosão do posto de gasolina, que quase acaba com Jim e basicamente destrói o veiculo que levava até a Califórnia; também a lendária sequência que o jovem para em um restaurante de estrada e encontra um dedo enquanto come as batatas fritas (essa cena é o poster da crítica). Como eu disse, Ryder sempre parece estar um passo a frente, e Jim se vê numa situação que não tem saída nem escapatória.

No restaurante de estrada, ele procura ajuda e conhece Nash (a bonita Jennifer Jason Leigh), uma jovem que trabalha no estabelecimento (da sua família). Nash é a única que vai conseguir ter contato com Jim durante esses acontecidos, e apesar do garoto estar em choque, ela consegue se apegar em suas palavras. Não vou dizer que Nash é a final girl do longa, porque aqui as regras mudaram.

A independente Nash.

De um jeito ou de outro, Jim acaba sendo pego pelos policiais e acusado de TODOS os crimes que haviam acontecido até então, e é aqui que as coisas começar a desandar para o personagem. Acho muito foda como as expressões do garoto se tornam vazias e sem propósito. Tantas coisas aconteceram com ele em um período tão curto de tempo, que nos momentos livres, o jovem só consegue ficar pensativo e deteriorado. Após não conseguir provar sua história para as autoridades, acaba sendo preso na pequena delegacia do interior.

John Ryder vira seu pesadelo, o destruindo e o ajudando. Ele aniquila a pequena delegacia somente para deixa a cela do jovem aberta, fazendo Jim ter a possibilidade de escapar, mas ao mesmo tempo, tendo que deixar uma pilha de corpos para trás, automaticamente se tonando o PRINCIPAL suspeito dos assassinatos. Ryder é o assassino perfeito, conseguindo armar situações que deixam o protagonista sem alternativa; se salva e se incrimina, ou morre. Destaque para a cena do cachorro pastor-alemão comendo um dos corpos (ouch...).

Marcas da guerra.

Jim se desmancha cada vez mais para conseguir sobreviver: sequestra dois policiais e até mesmo tenta se matar com um revólver (deixado para ele sem balas), em uma dramática cena. O garoto inocente não existia mais, sufocado pelo jogo doentio de John Ryder. A produção soube usar muito bem o orçamento, nos presenteando com ótimas cenas de ação bem coordenas: temos mirabolantes perseguições pelo deserto montanhoso, inúmeros carros capotados e destruídos, explosões cabulosas e até mesmo uma excelente queda de helicóptero. Belo exemplo de como manter o drama independente da época.

Em certo momento da história, Jim consegue encontrar a bonita Nash novamente, e convencê-la que é um inocente. Funciona, porque a garota começa ajuda-lo na caçada sangrenta pelas estradas. Nash não é burra como muitas final girls, e forma um belo casal com o protagonista. A película sempre foca em Jim, colocando ele basicamente em todas as cenas; isso é útil para vermos melhor as mudanças no personagem que pouco conhecemos. De certa maneira, John Ryder deixa todas as formas possíveis para Jim o matá-lo, mas isso só complicará mais ainda a vida do garoto perdido.

A criatividade é tudo.

Com uma armadilha mortal, Ryder consegue capturar Nash e deixá-la amarrada entre dois caminhões. Com o pé segurando a embreagem, o assassino consegue a atenção de Jim e dos policiais, explicando para nosso protagonista, que aquela era a chance que tinha de finalmente acabar com isso. Jim estava com a arma apontada para Ryder, e naquele momento tinha que escolher: se matar o assassino, o caminhão andaria e Nash seria cortada ao meio. Com a hesitação do garoto, Ryder solta o caminhão, e a tragédia acontece em um piscar de olhos; Jim agora carrega a morte de Nash em suas costas, sem capacidade o suficiente para ter evitado a tragédia.

Pego pela polícia, John Ryder se mantem indiferente da situação (ainda rola a clássica cena que Jim cospe meio litro em sua cara). Até mesmo as autoridades percebem uma conexão entre os dois. No entanto, durante a transferência do assassino, nosso protagonista desarma um policial, com o único objetivo de conseguir acabar com Ryder de uma vez por todas; o garoto sabia que ele era muito inteligente e astuto para ser preso. A solução tinha que ser a morte, obviamente.

Clássico assassino.

A sequência final é ótima e cheia de ação. Vemos um embate entre os dois no meio da estrada ensolarada, sem ninguém para impedir a morte eminente. Jim consegue atropelar o assassino com a viatura e fuzilá-lo sem a menor piedade; Ryder morreu ali mesmo, na beira de uma estrada qualquer, como acontecia com suas vitimas inocentes. Jim não tem mais aquele sorriso nem o olhar despreocupado, enquanto observa o pôr-do-sol no melhor estilo Mad Max (muito parecido mesmo, até a jaqueta de couro). Não ficamos tão felizes, porque sabemos que mesmo John Ryder estando finalmente morto, o garoto inocente se tornou um assassino sem remorso. Ele fez o jogo do vilão involuntariamente, etapa por etapa.

A trilha sonora final emite tristeza e solidão, fazendo o público sentir que aquele não foi um final feliz. O jovem provavelmente ficou com a vida destroçada depois desses dias, independente que em seu coração, se sentiu aliviado por ter acabado com o misterioso assassino. Nada valeu a pena, mas no calor do momento, era o único que podia fazer.

A Morte Pede Carona (1986) é mais um ótimo drama dos anos 80 e fica mais uma recomendação do Portal Tartárico. O filme teve uma continuação lançada em 2003, trazendo Thomas Howell novamente como Jim Halsey, e um remake em 2007, refilmagem direta deste aqui. O interessante dessa obra de 1986, é que ela consegue sair diferenciada dos outros inúmeros slasher que saíram naquela década, pois mantem uma atmosfera e história única, se privando de clichês e trazendo situações inusitadas, que enriquecem as escuras estradas sem lei do interior norte-americano. Vale a pena ser assistido, e lembre-se desse aviso necessário: se alguém chamado John Ryder lhe pedir carona algum dia, você acaba de morrer, moralmente e fisicamente.
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TRAILER DE 1986:

CONTAGEM DE CORPOS (número não exato):
Assassino John Ryder:
Motorista do fusca: morte offscreen.
Família viajante: assassinados no carro (morte offscreen)
Vários polícias na delegacia: mortos de diferentes formas (offscreen)
Dois policiais: fuzilados na viatura.
Grupo de policiais: carbonizados na queda de helicóptero e acidentes com as viaturas.
Nash: rasgada ao meio ao ser “esticada” por caminhão.
Três policiais: baleados na estrada.
Assassino Jim Halsey:
John Ryder: atropelado e estourado com espingarda calibre 12.
- {Agradecimentos pela ajuda do ilustre Cleiton Rattus} -

Um comentário:

  1. Bom na morte da garota era só a polícia ter atirado no motor com uma .50

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